sexta-feira, 8 de abril de 2011

Entrevista Ossarivm



Os portuenses “Ossarivm” foram responsáveis por um dos lançamentos que mais me cativou recentemente. O EP “Emanation”, lançado em 2010 pela Latrina do Chifrudo, é um monumento de negrume que já foi alvo de uma pequena análise neste blog. A entrevista que se segue permite-nos perceber um pouco melhor os caminhos percorridos pela banda.

A vossa aparição em cena foi um pouco abrupta. É como se tivessem vindo do nada, deixado entre nós esta maldição e voltassem de novo a refundir-se num qualquer recanto obscuro. A verdade é que muito pouco se sabe acerca dos Ossarivm, mas o vosso lançamento de estreia, Emanation, deixa a ideia de que vocês já não são nenhuns novatos nestas coisas. Podem expor um pouco da história, motivações e objectivos deste projecto?

Ossarivm veio do nada e para lá voltou. Faz parte da imagem que se quer transmitir. No background de Ossarivm existem projectos de diversos géneros e contextos, desde o Black Metal à música ambiental e concreta. No entanto, o elo comum acaba por ser o interesse pela experimentação, nem que seja a um nível pessoal apenas, mas que depois acaba sempre por transparecer, tal como no caso de Ossarivm.

Julgo que a motivação foi mesmo a de criar algo dentro do Death Metal. Discos que recentemente foram editados como os de Teitanblood, Witchrist ou Impetuous Ritual acabaram por relembrar o mundo que o Death Metal pode ainda ser um estilo extremamente interessante e refrescante em termos de soluções. Há muito que já não se ouviam composições tão retorcidas e sufocantes como estas e isso acabou por nós relembrar dos tempos áureos de Morbid Angel, Autopsy ou Incantation. O espírito nauseabundo do Death Metal estava de volta, sem tecnicismos inócuos e fúteis, como uma massa sonora realmente abissal. Julgo que o grande impulso para que Ossarivm seguisse em frente e realmente gravasse foi este relembrar.

Quanto aos objectivos estes são igualmente pouco claros. O projecto nasceu de ideias já criadas, apontamentos perdidos e remetidos para canto ao longo dos anos. Foi uma junção de partes num processo moroso de selecção e rejeição. O primeiro lançamento foi editado e certamente um segundo será gravado assim que as condições o tornem viável. As coisas fluem naturalmente e sem pressões.

A sonoridade dos Ossarivm, aliada ao artwork e aos títulos das faixas, criou em mim a ideia de que são uma banda que lida com temáticas ligadas ao Oculto. Existe alguma intenção religiosa ou espiritual nas vossas composições?

Religiosa não digo, pois isso remete sempre para uma conotação de dogma. Existe sim uma espiritualidade inerente aos ambientes criados. Um ossário é um espaço com uma carga emotiva gigantesca. Cada despojo humano contém uma história cuja continuidade narrativa nos transcende. É um pouco essa transcendência que a música de Ossarivm tenta emanar. É um mantra violento, um turbilhão sonoro que invoca imagens e sensações oníricas e surreais. Uma dimensão mítica, envolta em mistério, oculta, tal como referiste. Ao não haver uma narrativa explícita ou clara, o ouvinte apenas tem pistas, mas são mais do que suficientes para estabelecer uma viagem mental muito pessoal.

As passagens ambientais são, a meu ver, uma parte fundamental no encanto da vossa música. Gostaria que me explicassem se estas passagens faziam parte da vossa ideia inicial para o projecto ou se foi algo que sentiram necessidade de adicionar posteriormente para dar mais profundidade ao resultado final?

As secções ambientais, mais do que meras passagens, são partes tão centrais como as mais agressivas e são vitais para a dinâmica da música de Ossarivm. É comum ver-se no Metal e em outros derivados do Rock a tendência para submeter faixas mais abstractas ou menos convencionas ao rótulo de “intro” ou “outro” quando estas abordagens poderiam ter um carácter bem mais marcante.

No caso de Ossarivm, pode-se dizer que o grande desafio foi criar o entrosamento entre as diferentes partes, ou seja, não criar estanquicidade entre “faixa Death Metal” e “faixa ambiental”, até porque o principal objectivo era que o todo do lançamento fosse fluído. Mais do que criar músicas, aqui existe o esforço de se criar um lançamento fluido. Existe um enorme fascínio pela música industrial / ambiental de carácter ocultista do final dos anos 80, tal como Sigillum S, Lustmord, Archon Satani ou o primeiro de Ain Soph. Também a música ritualista de Halo Manash, Exotoendo ou Aeoga teve o seu impacto, assim como música litúrgica budista. Acima de tudo, a música é um veículo para ideias e sensações. Não se deve menosprezar os valores intrínsecos ao som e focar apenas nas notas e acordes. Como é possível quando existe toda uma panóplia de outros parâmetros a explorar e capazes de trazer uma nova dimensão ao que se faz?

Numa época em que se vem assistindo a um grande crescimento das chamadas “one-man band”, vocês ainda podem ser inseridos no conceito original de banda? Têm planos para tocar ao vivo?

Não existem planos para tocar ao vivo. Quanto a esse conceito original de banda… não existem ensaios regulares, não existem hierarquias de banda nem tão pouco local de trabalho ou estúdio onde os esforços de Ossarivm estejam circunscritos, por isso julgo que a ideia de banda que se junta duas vezes por semana para compor e ensaiar não se aplica aqui. Quando surgir uma vontade de se gravar e testar coisas, assim se fará. É um processo lento e sem pressões.

Como tem sido a reacção ao vosso trabalho?

Tem sido boa até agora. Pelo que temos lido em alguns blogues as pessoas têm gostado e isso é sempre positivo para o projecto.

Já existem planos para futuros lançamentos?

Não existem propriamente planos, apenas uma vontade de dar continuidade. Tal como disse acima, o processo é moroso e há muita rejeição pelo caminho. Antes de se enveredar pelo trilho certo existem muitos outros para errar e os atalhos nunca são uma boa solução.




O EP "Emanation" pode ser adquirido através da Latrina do Chifrudo.